Ontem não foi domingo aqui dentro. Nem flor, nem presente, nem propaganda bonita me alcançaram. Porque ser mãe sozinha é coisa de outro tempo, de outro corpo, de outra ordem. A gente não espera mais aplauso, mas às vezes sonha com colo. E quem vive de sustento e silêncio aprende a costurar alegria no avesso da falta.
Tem dias que acordo antes do sol, não por querer, mas por necessidade. A marmita tá lá esperando, o uniforme também. E a criança? Dorme feito anjo bagunçado no lençol. O tempo corre feito gado solto e eu corro atrás dele, laçando tarefa, dívida, reunião, carinho e uma lasquinha de paz se der tempo. Às vezes não dá. Mas sigo.
Tem noite que penso se tô dando conta. A geladeira cobrando mais que agiota, a lista da escola que não acaba, o peito doendo de saudade de mim mesma. E ainda assim, no meio disso tudo, tem uma risada que me puxa de volta. Aquele sorriso banguela, ou aquele jeito de dizer te amo torto, com chocolate na cara. Aquilo me segura. Me faz lembrar por que sigo. Me faz ficar.
Não tem plateia, não tem troféu, mas tem um mundo inteiro crescendo dentro da minha casa. Um mundo que eu ajudo a plantar, mesmo com as mãos calejadas, mesmo sem manual. Ser mãe só é ser tudo o que é preciso ser, mesmo quando o corpo pede arrego e a alma chora baixinho no banheiro.
Eu falo aqui com outras como eu. Com as que fazem mágica com pouco, que sabem de cor a arte de equilibrar o cansaço com afeto. Com as que aprenderam que criar filho é também se recriar todo dia, mesmo sem saber direito como. Com as que já esqueceram o que é dormir uma noite inteira, mas lembram até do primeiro o, da primeira palavra, da febre às três da manhã.
A gente é muitas. E tá tudo bem às vezes se sentir só, cansada, brava. Mãe também sente raiva, também tem medo. O que a gente não tem é tempo pra fingir que tá tudo bem quando não tá. Mas mesmo assim, seguimos.
Porque, no fundo, no miolo mesmo da coisa, a gente sabe que esses filhos, esses pedacinhos de mundo que a gente trouxe pra cá, são também o que há de mais bonito em nós. E é neles que a gente repousa, sonha e segue.
Seguimos.
Com o cabelo preso de qualquer jeito, com a esperança meio torta, com a coragem no susto. Mas seguimos. E isso, minha amiga, é mais do que ser mãe. É ser tempestade e calmaria. É ser raiz, flor e fruto.
É ser mais do que uma.