
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que considerou inconstitucional parte do sistema de autolicenciamento ambiental implementado pelo governo Eduardo Leite deve impactar 31 atividades produtivas de médio e alto potencial poluidor no Rio Grande do Sul. São práticas que o governo do Estado hoje libera por autolicenciamento e que, a partir da decisão da Corte, devem voltar ao formato tradicional de análise ambiental.
Em julgamento concluído na sexta-feira (4), o STF avaliou ser inconstitucional a liberação para atividades de médio e alto potencial poluidor. Na lista, estão práticas como a silvicultura, a operação de dragas, a fabricação de concreto e a criação de suínos, conforme classificação da Secretaria Estadual de Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema).
A tese vencedora no julgamento do STF, do relator ministro Cristiano Zanin, é de que apenas atividades de baixo risco de degradação podem ser liberadas com o mecanismo de autolicenciamento (veja a lista abaixo).
Acompanharam o voto do relator, outros seis ministros: Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Cármen Lúcia, Flávio Dino, Alexandre de Moraes e Luiz Fux. Os votos derrotados são dos ministros Gilmar Mendes, Dias Toffoli, André Mendonça e Nunes Marques.
O autolicenciamento foi proposto pelo governador Eduardo Leite em 2019, aprovada pela Assembleia Legislativa no mesmo ano e implementada pelo governo do Estado em 2022.
Ação andou após tragédia climática no RS
A ação é de autoria da Procuradoria-Geral da República (PGR) que, desde 2020, aponta que a legislação gaúcha descumpre a Constituição e gera riscos ao meio ambiente. Desde 2021, o processo estava pronto para ser julgado.
Depois de o Rio Grande do Sul enfrentar, em 2024, a sua maior catástrofe socioambiental, com as enchentes de maio, o relator do caso no STF proferiu, em agosto, o seu voto no sentido de limitar o uso do autolicenciamento. O julgamento chega ao fim mais de quatro anos depois de a ação ser proposta.
"Ressalto, novamente, que o licenciamento ambiental não configura mera burocracia, 'mas um dos processos preventivos mais importantes em tema de proteção ao meio ambiente'. Se é a partir desse instrumento que a istração Pública exerce o poder de polícia de forma preventiva em matéria ambiental, não pode o ente federado estabelecer rito que confira proteção insuficiente ao meio ambiente", diz trecho do voto de Zanin.
Procurado, o governo do Estado emitiu uma nota assinada pela Procuradoria-Geral do Estado (PGE), dizendo que "aguarda a publicação do acórdão e avaliará eventual medida jurídica a ser adotada".
O que é o autolicenciamento
A proposta de autolicenciamento foi inserida pelo governo no regramento estadual, em 2019, no processo de alteração do Código Estadual de Meio Ambiente.
No sistema tradicional, a emissão da licença ambiental depende de análise e aprovação de técnicos do órgão de meio ambiente — no Rio Grande do Sul, a Fepam. No modelo de autolicenciamento, o empreendedor envia os documentos exigidos pelo sistema online, se compromete a respeitar as regras ambientais e a permissão é emitida pela internet.
Tecnicamente chamado de Licença por Adesão e Compromisso (LAC), o autolicenciamento é aplicado pela Sema para 49 atividades produtivas — das quais 31 são de médio e alto potencial poluidor.
O autolicenciamento ambiental é criticado por ambientalistas — eles alegam que o mecanismo impõe riscos de danos à natureza e insegurança jurídica — e defendido por setores empresariais — estes apontam que o mecanismo reduz a burocracia e agiliza a abertura de empresas.