Projetos de acolhimento são realizados no Juizado da Violência Doméstica em Porto Alegre

Prisões

A possibilidade de que o agressor seja preso ao descumprir a medida protetiva, sem que para isso seja necessário que ele cometa nova violência, como lesão ou ameaça, é apontada pela delegada Cristiane Ramos, da Delegacia da Mulher de Porto Alegre e diretora da Divisão de Proteção à Mulher do RS, como um dos fatores importantes no combate a esse tipo de crime. Mas, para isso, é essencial que as vítimas notifiquem os descumprimentos.  

— Os números de mulheres que acabam vítimas depois da medida são muito menores. Sem o registro, o Estado não sabe onde está essa mulher, potencialmente vítima de feminicídio. Ainda que aconteça, a morte com medida protetiva é exceção. A regra é que a medida funciona. A maioria dos homens cumpre. Mas sempre que ele descumpre, é preciso que a mulher notifique. Se aproximou, ligou, mandou mensagem, é um novo crime, que implica em prisão — diz a delegada.   

À frente da Promotoria de Justiça Especializada de Combate à Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher de Porto Alegre, o promotor Marcelo Ries ressalta que a medida também tem papel coercitivo, pelo receio que gera de possível prisão.  

— Há muitos casos de homens que sem a medida perseguiam, mas com a medida param, porque gera medo. Há senso comum entre os homens de que a Maria da Penha dá prisão. E não é só senso comum. A lei trouxe facilidade para prender um agressor, no caso de descumprimento de medida. Sem medida protetiva, há mais dificuldade de prender quem faz ameaça ou persegue, porque é um crime com pena menor — explica.  

No primeiro semestre do ano, foram 2.082 prisões por violência doméstica no Estado, o que representa 13,6% do total de detidos no RS. Isso representa 15% a mais do que no mesmo período de 2021. Um terço das prisões aconteceram em 10 municípios. 

 “É eficaz se o agressor tem medo de perder alguma coisa”, diz vítima

A primeira vez em que foi agredida fisicamente pelo ex-companheiro, Isabela*, 30 anos, moradora do interior do Estado, acreditou que iria morrer. Ela já havia se separado do homem com quem manteve quase uma década de relacionamento. O ataque aconteceu dentro da casa dela. Com medida protetiva contra o ex, que chegou a ser preso, sofre de estresse pós-traumático e briga na Justiça pela condenação do agressor.  

— Ele olhou para mim e disse: "Vou me matar, mas antes vou te matar". Segurou meus cabelos, me jogou no sofá e começou a me estrangular. Quando olhei nos olhos dele, percebi que realmente iria me matar. Não me xingou. Não estava raivoso. Estava frio. Disse que ia me matar, segurou minha garganta, e estava me matando — recorda a mulher.  

Quando Isabela conseguiu se desvencilhar e correr até outro cômodo, o ex-companheiro ainda procurou uma faca.  

— A lâmina atravessou a porta — descreve.  

Isabela pediu socorro pelo telefone, a polícia chegou logo depois e prendeu o agressor em flagrante. Na Unidade de Pronto Atendimento (UPA), para onde os dois foram levados, Isabela diz que foi atendida por um médico, que indagou se ela realmente iria pedir medida protetiva.  

— Ele tentou me desencorajar. Disse: “Mas tu vai deixar ele com mais raiva”. Se não estivesse decidida, poderia me dissuadir. Mas quem faz uma vez, faz de novo — diz.  

Isabela se manteve firme, fez o registro na Polícia Civil e solicitou medida protetiva. Enquanto ainda se recuperava, recebeu telefonema e pensou que era o oficial de Justiça, mas teve uma surpresa:  

— Era o meu agressor, me ligando de dentro da cadeia, com voz de choro, se fazendo de vítima.  

Ele olhou para mim e disse: 'Vou me matar, mas antes vou te matar'. Segurou meus cabelos, me jogou no sofá e começou a me estrangular. Quando olhei nos olhos dele, percebi que realmente iria me matar. Não me xingou. Não estava raivoso. Estava frio. Disse que ia me matar, segurou minha garganta, e estava me matando.

VÍTIMA DE VIOLÊNCIA

30 anos

No dia seguinte, ele recebeu da Justiça o direito de responder em liberdade e foi solto. Isabela conta que o advogado do ex foi até a casa dela buscar os pertences do cliente. Já com medida protetiva, ela se assustou ao ver que o agressor estava dentro do carro e chegou a comunicar o fato, entendendo aquilo como descumprimento. 

— Notifiquei e o oficial de Justiça entrou em contato comigo. Ele disse que dava para ignorar aquela vez porque ele só foi buscar os pertences. Essa questão da medida é muito sensível. Cabe interpretações. Por mais que esteja ali escrito que não pode chegar perto, dependendo do profissional que vai receber a denúncia, abre interpretação. Pelo que está escrito, pela teoria, ele quebrou a medida protetiva e deveria ser preso. Se aproximou de mim a menos de 300 metros — relata.  

Atualmente, o ex-companheira responde por lesão corporal, já que não houve comprovação da esganadura, que configuraria a tentativa de feminicídio. Enquanto isso, Isabela ainda a por tratamento psicológico e psiquiátrico. Com vergonha, até hoje ela não conseguiu contar para a própria mãe o que aconteceu.  

— Estou nessa luta, de juntar todos os cacos. A medida protetiva é eficaz se o agressor tem medo de perder alguma coisa, seja material, profissional, ou mesmo o respeito. Ela protege das agressões físicas, mas não oferece segurança psicológica para a vítima. Ele não pode se aproximar de mim, não pode entrar em contato. Mas faz manipulações psicológicas, por meio de outras pessoas. Não tem como mensurar o tamanho das lesões psicológicas, quando não tem hematoma ou lesão — desabafa. 

 * Esses nomes são fictícios.  

Parte 2 -   Fortalecimento da rede e monitoramento do agressor:  caminhos para prevenir casos nos quais medida protetiva não evita feminicídio 


Tire suas dúvidas 

Quem pode pedir medida protetiva?

O que é considerado violência doméstica?

Como posso obter a medida protetiva?

Quais tipos de medidas protetivas possíveis?

Quanto tempo dura a medida protetiva?

E se ele descumprir?

Descumprimento da medida pode ser punido?

O que é a Patrulha Maria da Penha?

Onde posso obter mais informações?

Como pedir ajuda 

Brigada Militar – 190

Polícia Civil

Delegacia Online

Central de Atendimento à Mulher 24 Horas – Disque 180

Defensoria Pública – Disque 0800-644-5556

Centros de Referência de Atendimento à Mulher

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